sexta-feira, 28 de abril de 2023

Wonderland

Depois de alguns dias fora, sou assolada por uma leveza e tranquilidade que há muito já não sentia. Próxima da sensação de conduzir de janela aberta, quando o calor é tanto que queima a pele e sufoca o ar. É a isso que sabe uma pausa. É a isso que sabe desligarmo-nos do mundo exterior e perdermos uns dias para estarmos só connosco - sem mais ninguém. Ultimamente, tenho também conseguido desligar-me da eterna questão “e se?”, que me aparecia demasiadas vezes. Perdia-me, em demasiadas horas vagas, a questionar-se como seria a vida, se a própria vida fosse diferente. As pessoas mais próximas, com quem falo abertamente sobre os temas que me apoquentam, tranquilizam-me. Ainda vai rolar muita tinta. E é verdade: a vida ainda é longa e muita coisa pode mudar. Acho que, por esse motivo, continua a fascinar-me a ideia de um dia nos voltarmos a cruzar. Há dias, poucos, sonhei com isso. Que esbarrávamos uma na outra, num dia de chuva, em Porto Campanhã. Lembrei-me de uma música de que gosto particularmente. Que roubou o nome a essa mundialmente conhecida estação e que, quem sabe, me diga tanto porque me recorda de ti. Eu passo em Campanhã para te ir buscar, depois decides até quando ficas, para já só tens mesmo é que cá chegar. Com isso, sou preenchida de memórias tuas. Memórias boas, que ainda me aquecem as mãos num dia de frio. Não deixo de estranhar que continue a ser assim: que permaneças uma recordação quente e acolhedora. Que me oferece paz de espírito. Uma recordação longínqua, de um amor que nos entreteve nas horas vagas, enquanto procurámos sentido na vida. Ainda que tenhas sido mais que isso - e continues a ser. Não te quero puxar para mim. Quero que vivas a tua vida. Que encontres o teu caminho, enquanto também eu procuro pelo meu. Quem sabe, um dia esbarremos mesmo uma na outra. Quem sabe, um dia os nossos olhares se cruzem. Quem sabe. A vida é tão incerta. Mas o conforto, o amor e a paz são certos demais. Cobrem-nos de uma certeza que nos transcende. Que nos conduz, mais cedo ou mais tarde, ao lugar onde pertencemos. E eu ainda sinto que te pertenço. Não como uma propriedade; mas como um local onde me sinto em paz. Onde não faz vento, e só uma aragem leve e serena corre no ar. Onde o amor é uma flor, num dia menos bom, mas também a nossa roupa a lavar, na mesma máquina, ao fim da noite. Onde o mais comum é só extraordinário. 

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