domingo, 19 de março de 2023

Podemos não esperar por outra vida?

Sentei-me à beira mar e deixei-me consumir pela maresia que pairava no ar. O bater das ondas traziam-me até à pele salpicos de sal; e o meu peito encheu-se de uma frescura que não conseguia encontrar noutro sítio. Fechei os olhos, certa de que precisava de sair deste modo. Que não podia manter o coração fechado numa caixa, ignorando as emoções que me consomem. Lembrei-me do que há uns dias lhe confessei. Que costumo manter a minha tranquilidade; mas que há momentos na vida, quando a maré fica mais brava, em que perco o equilíbrio. Deixo de conseguir distinguir-me das emoções que me consomem. Não sei, verdadeiramente, o que me consome: se és tu ou se sou só eu, que não consigo libertar-me (ou libertar-nos) daqui. Achas que pode haver uma justificação para isso? Uma razão cósmica para a distância nunca ser suficiente para nos libertar uma da outra? Atrevi-me a procurar-te nas minhas memórias. Uma novidade dos últimos dias. Tenho-te mantido no fundo, numa tentativa desesperada de me vencer pelo cansaço. Se nunca tiveres existido, não poderei sentir a tua falta.  Mas nunca é assim tão simples. Recordo-me do ano que passou. Dos 365 dias que se foram. Dos muitos, desses 365, em que acreditei que a vida nos daria uma chance. Dos poucos em que me contavas como estava a tua vida. É estranho como nunca, no tempo em que nos conhecemos, confiei tão pouco em ti. Acho que, na minha consciência, nunca confiava verdadeiramente que as histórias que me contavas fossem verdade. Mas fui aprendendo a viver com isso. Porque sempre acreditei que acedia a partes de ti que mais ninguém tinha. Que te tocava na alma, como tu me tocavas a mim. E que, ao contrário de quase tudo na vida, isso fosse insubstituível. Nunca nos compreendi, hoje sei disso. Mas fui também aprendendo a viver com isso. Sabia que isso era parte do risco de me entregar a ti. De me apaixonar outra vez por ti. Se tivesse que dar um nome a tudo o que se passou, sei que poderia dizer que dei um salto de fé. Acreditei que o que nos unia era mais forte, e resistente, do que o que nos separava. Sei que, por muitas vezes, não foste honesta. Acho que, no fundo, reconheço hoje que a honestidade nunca foi o teu forte. Sempre foste demasiado tentada pela mentira. Sempre suspeitei que isso se devesse a achares que não serias suficiente. Que eu precisava que fosses mais. Tenho pena que nunca tenhas compreendido que nunca foi assim. Que, durante todo este tempo, eras mais que suficiente. Eras o que eu queria. Como não queria mais ninguém. Tentei apagar isso com outras pessoas. Tenho-o escrito muitas vezes: tentei procurar o que me fazias sentir noutros lugares. Mas nunca, nada, parece suficiente. Não sei explicar este desgosto que me consome; que me desalinha quando penso demasiado em ti; que me tira o sono, quando a tua presença parece mais visível. Despedimo-nos de uma forma insignificante. Não me esqueço da última coisa que me disseste, que me tirou o sabor do café nesse dia, e me fez correr lágrimas de um dissabor que me consumia o estômago. “Até uma próxima vida”. Palavras minhas que reproduziste. Palavras que nunca te quis dizer; mas que o meu orgulho não controlou. Ainda as engulo em seco. Porque, apesar de tudo, continuo a ter fortes suspeitas de que estamos a fazer tudo de forma errada.

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